sexta-feira, 6 de julho de 2012


Drama de sinhazinha, em Gabriela, comove o país

- Meu marido, mulher casada não pode gostar (de sexo)?
- Não pode não. E nem mais uma palavra senão te prendo em casa e não sai nem para ir à igreja. O marido é que usa o corpo da mulher e se lambuza. A mulher serve e, se for decente, espera até o marido terminar, calada! E agora deita e cala essa boca!
Osmundo (Erik Marmo) e Sinhazinha (Maitê Proença)
Esse diálogo assustador entre o rude coronel Jesuíno (José Wilker) e sua mulher, a doce Sinhazinha (Maitê Proença) é apenas um entre vários travados pelo melhor núcleo de Gabriela. Por mais que Juliana Paes esteja linda e sedutora e Malvina (Vanessa Giácomo) desfile vigor e rebeldia, nada me impressiona mais do que a violência física e, principalmente, psicológica de Jesuíno contra sua esposa. Em Fina Estampa, por mais que Celeste (Dira Paes) levasse surras injustificáveis de Baltazar (Alexandre Nero), seu sofrimento recebia a solidariedade e, algumas vezes, até a defesa dos amigos e vizinhos. Sinhazinha, não. Sua dor é silenciosa, calada e até justificada, já que mulher não tinha mesmo direito a nada e fora criada apenas para servir seu marido e sua família. E em todos os setores. Sim, porque noite após noite, o coronel exige que a esposa interrompa sua refeição, vá se arrumar porque ele irá usá-la. E literalmente o faz com violência, desumanidade e frieza, como se a parceira fosse um mero objeto. Para piorar, Sinhazinha é tão frágil, suave… quase etérea, o que torna tudo ainda mais revoltante.
Malvina (Vanessa Giácomo)
A primeira vez que assisti a esse abuso, fiquei tão chocado que custei a dormir. Foi muito mais forte do que qualquer sequência de sexo, nudez ou violência física. É no drama de Sinhazinha que o autor Walcyr Carrasco destina seu melhor texto e ele vem se superando a cada capítulo. A direção nada apelativa encontrou uma forma de impactar o público sem precisar abusar de recursos explícitos ou de mau gosto. O monstro José Wilker arrebata com tamanha agressividade, o que torna Jesuíno um dos personagens mais repugnantes de toda a história de nossa teledramaturgia. Já Maitê Proença tem em Gabriela o melhor papel de sua carreira. Mesmo sendo uma atriz de poucos recursos, ela toca nosso coração. Sinhazinha é mais inocente do que uma criança, já que saiu da casa dos pais para os braços de um homem bruto e ignorante. Por isso, não entende e não sabe como lidar com o sentimento que começa a nutrir pelo Dr. Osmundo (Erick Marmo). O primeiro beijo de língua que ela deu na vida foi com o rapaz e Sinhazinha não resistirá ao sentimento que nunca conheceu: o amor. E pagará um preço terrível por ousar ser feliz. No final das contas sinto um misto de revolta e admiração por esse núcleo tão complexo. Revolta por constatar todo o desrespeito que as mulheres sofreram (e ainda sofrem) ao longo da História. E admiração por ver uma obra de arte tratar um tem tão difícil como esse com tamanha qualidade. Só pelo drama de Sinhazinha, Gabriela já deixou sua marca na antologia de nossas teleproduções.

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